terça-feira, 30 de setembro de 2008


Contando os dias pro término dessa bandalheira e festival de baixaria e falta de ética que chamam de campanha eleitoral, incluindo o famigerado horário eleitoral gratuito na tv, resolvi selecionar algumas frases sobre política para publicar no Caderno 2 até domingo, dia das eleições municipais:

A política tem a sua fonte na perversidade e não na grandeza do espírito humano. (Voltaire)

A política é um charco. As pessoas de bem têm de andar com um lenço no nariz.
(Jéferson Peres)

A política é uma delicada teia de aranha em que lutam inúmeras moscas mutiladas. (Alfred de Musset)

Eu acredito em tudo o que os políticos dizem, principalmente o que eles dizem uns dos outros. (autor desconhecido)

Nada é tão admirável em política quanto uma memória curta. (John Kenneth Galbraith)

Os políticos brasileiros são os mais religiosos do mundo: Não assinam nada sem levar um terço. (autor desconhecido)

A política foi primeiro a arte de impedir as pessoas de se intrometerem naquilo que lhes diz respeito. Em época posterior, acrescentaram-lhe a arte de forçar as pessoas a decidir sobre o que não entendem. (Paul Valéry)

A ação política é cruel; baseia-se numa competição animal, é preciso derrotar, esmagar, matar, aniquilar o inimigo.
(Otto Lara Resende)

Há duas maneiras de fazer política. Ou se vive para a política ou se vive da política. Nessa oposição não há nada de exclusivo. Muito ao contrário, em geral se fazem uma e outra coisa ao mesmo tempo, tanto idealmente quanto na prática. (Max Weber)

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Sarah Chang em São Paulo


Dias 11, 12 e 13 de desembro, Sarah Chang toca no Brasil, na Sala São Paulo, sede da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, maior e mais moderna sala de concertos da América Latina, no Complexo Cultural Júlio Prestes (prédio da antiga estação de trens da Estrada de Ferro Sorocabana), especialmente construída para receber os melhores músicos e as melhores orquestras sinfônicas do mundo.
John Neschling regente, Sarah Chang violino.
No programa, Johannes Brahms.
Variações sobre um Tema de Haydn, Op.56a
Concerto para Violino em Ré maior, Op.77
Sinfonia nº 2 em Ré maior, Op.73
Mais informações: www.osesp.art.br

Me apaixonei por Sarah Chang ouvindo-a tocar uma belíssima Sonata de Paganini e tõ louco pra ouvir quatro CDs seus: Dvorák Violin Concert (Quintet/London Symphony/Sir Colin Davis/Leif Ove Andsnes 2003), Tchaikovsky/Dvorák (Sextets/Berlin Philharmonic Members 2002), Paganini Violin Concert (Saint Saens/Philadelphia Orchestra/Wolfgang Sawallisch 1994), Paganini Violin Concert/Live European Concert 1995 (Zubin Mehta, Berlin Philharmonic Orchestra) e Concert for Planet Earth, Live Recording/Placido Domingo/Wynton Marsalis 1992 (gravado ao vivo no Rio de Janeiro, em 1992, no Concert for Planet Earth, durante a Conferência Eco 92. com Plácido Domingo e Wynton Marsalis. Sarah Chang toca Puccini, Paganini, Saint-Saëns, Bernstein e os compositores latinos Carlos Gardel, Jose Serrano e Pablo Sorozabal).

“Sarah Chang tem 28 anos. É americana. Nasceu em Philadelphia. É um desses seres de música que tem no violino seu mais intimo e perfeito meio de expressão e de comunicação. Cada uma das notas que tira do seu instrumento tem voz e grão de altíssima qualidade, cada uma de suas arcadas tem a perfeita tensão”.
Maestro Georges Henry (georgeshenry.spaceblog.com.br)

Sarah Chang em foto de Sheila Rock

(clique sobre as imagens para vê-las ampliadas)


O site http://sarahchang.com/ disponibiliza o download de um vídeo com Sarah Chang tocando Vivaldi Four Seasons. Pra comprar seus CDs pela internet a dica é o site www.cdpoint.com.br

Morte de Machado de Assis
completa hoje 100 anos
Foto de Marc Ferrez

Completa 100 anos nesta segunda-feira a morte do escritor Machado de Assis, romancista, contista, poeta e teatrólogo, considerado um dos mais importantes nomes da literatura do Brasil.
Sua vasta obra inclui ainda a crítica literária. Machado de Assis foi também um dos fundadores e o primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras, chamada de Casa de Machado.
De saúde frágil, epilético, gago, Joaquim Maria Machado de Assis ficou órfão de mãe muito cedo e também perdeu a irmã mais nova. Ele não chegou a freqüentar a escola, mas, em 1851, com a morte do pai, tornou-se vendedor de doces. No colégio teve contato com professores e alunos.
Mesmo sem ter acesso a cursos regulares, empenhou-se em aprender e se tornou um dos maiores intelectuais do País, ainda muito jovem.
Em 1855, aos 15 anos, Machado de Assis estreou na literatura, com a publicação do poema Ela na revista Marmota Fluminense. Continuou colaborando intensamente nos jornais, como cronista, contista, poeta e crítico literário, tornando-se respeitado como intelectual antes mesmo de se firmar como grande romancista.
Aos poucos, Machado de Assis passou a dedicar mais seu tempo à carreira literária e escreveu uma série de livros de caráter romântico. Entre as obras que marcar a primeira fase da sua carreira estão: Ressurreição (1872), Helena (1876), além das coletâneas Contos Fluminenses (1870)
Em 1881, o escritor abandonou, definitivamente, o romantismo da primeira fase de sua obra e publicou Memórias Póstumas de Brás Cubas, que marca o início do realismo no Brasil.
Tanto Memórias Póstumas como as demais obras de sua segunda fase vão muito além dos limites do realismo, apesar de serem normalmente classificados nessa escola.
No momento áureo de sua carreira literária, Assis escreveu além de Memórias Póstumas de Brás Cubas, outras obras memoráveis como Quincas Borba (1892) e Dom Casmurro (1900).
Após a morte da mulher, Carolina Xavier de Novaes, em 1904, o autor entrou em um momento de tristeza em sua vida. Muito doente, solitário e triste depois da morte dela, Machado de Assis morreu em 29 de setembro de 1908, em sua velha casa no bairro carioca do Cosme Velho.
(clique sobre a foto para vê-la ampliada)
Rio de Janeiro da época de Machado de Assis

Quatro frases e um poema do nosso grande Machado:
Alguma coisa sempre escapa ao naufrágio das ilusões.

Cada qual sabe amar a seu modo; o modo, pouco importa; o essencial é que saiba amar.

Não tive filhos não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria. Memórias Póstumas de Brás Cubas)

É melhor, muito melhor, contentar-se com a realidade; se ela não é tão brilhante como os sonhos, tem pelo menos a vantagem de existir.

SAUDADE

Por que sinto falta de você? Por que esta saudade?
Eu não te vejo mas imagino suas expressões, sua voz teu cheiro.
Sua amizade me faz sonhar com um carinho,
Um caminhar, a luz da lua, a beira mar.
Saudade este sentimento de vazio que me tira o sono
me fazendo sentir num triste abandono, é amizade eu sei, será amor talvez...
Só não quero perder sua amizade, esta amizade...
Que me fortalece me enobrece por ter você.

(Machado de Assis)
Cuidado, lá vem o quero-quero!
Aproveitando a proximidade do Dia da Ave, comemorado em 5 de outubro, e à propósito da postagem anterior, sobre o ataque aéreo de um Quero-quero ao repórter fotográfico Édio Junior (rs), fiz uma rápida pesquisa e quero dividir com você o que aprendi sobre essa ave tão comum em todos os gramados de estádios de futebol do sul e sudeste do Brasil.
Quero-quero (nome científico:Vanellus chilensis)

Eles moram ali. Imagine se uma ou duas vezes por semana sua casa fosse invadida por 22 marmanjos, dois sujeitos de bandeira na mão o e um terceiro com apito na boca? Pior: imagine que esses marmanjos tragam uma ameaça física para a integridade de sua família... Esse é o suplício que o mais constante dos bichos do futebol brasileiro enfrenta a cada rodada. Raro é o gramado brasileiro atual que não abriga uma família de Vanellus chilensis, o popular quero-quero, uma ave territorial e teoricamente simpática. E raro é o jogo em que os pobres bichinhos não corram o risco de serem alvejados por uma bola vadia.
O quero-quero fica em áreas abertas, por isso é comum encontrá-lo em aeroportos, campos de futebol e pistas de corrida. O que acontece é que, de acordo com o período do ano, eles se juntam para o acasalamento e fazem do local seu próprio habitat.. Fazem ninhos, criam filhotes e começam a defender este espaço. Eles não precisam de muita coisa para fazer um ninho - explica o biólogo Fernando Camargo, da Universidade Federal do Paraná.
Como bons pontas, costumam ficar nas extremidades dos gramados, lugares que onde deveriam ter maior tranqüilidade. “Acredito que próximo as bandeirinhas de escanteio e dos gols sejam os lugares preferidos porque têm um pouco mais de privacidade, até mesmo durante as partidas,” diz o biólogo.
Para o também biólogo Leonardo Mohr, do Instituo Chico Mendes, do Ibama, o crescimento das grandes cidades é o fator responsável pela invasão nos estádios. “Quanto mais as cidades crescem, menor é o espaço para as espécies em geral. As aves acabam procurando espaços disponíveis, que muitas vezes têm relação direta com a espécie humana. O quero-quero é um bicho característico de campo aberto e busca ambientes sossegados, como são os estádios de futebol em dias que não tem partida.
Se há registro de “ataques” de jogadores, que atingiram os quero-queros com boladas, não se espante se os bichos derem o troco. Para isso basta que coloquem em risco a integridade física de seus filhotes
O quero-quero é uma ave territorialista e defende de maneira aguerrida seu espaço. Em período de reprodução, o risco de ataque é grande. Eles acham que os humanos são predadores (coitado do meu amigo Édio...rs) e que podem fazer mal à suas crias. Como defesa, eles fazem vôos rasantes para assustar. Mas podem reparar que é comum também se fazerem de coitado, simulam lesões, para que virem o alvo, e não os filhotes - que o diga o meia Da Silva, do Marília, alvo da ira da ave em partida do Marília, no mesmo estádio Bento de Abreu, contra o Noroeste, de Bauru, em 2007, pela Copa Federação Paulista de Futebol. Rendeu até matéria pro Fantástico (hehehe).

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Ave-Símbolo do Rio Grande do Sul, o Quero-quero (Vanellus Chilensis) tem como marca sempre se manifestar quando ter seu território invadido e ser briguenta contra qualquer espécie que o deixe acuado. O apelido "quero-quero" deriva do som de seu canto.
Ataque no gramado

O repórter fotográfico Édio Junior, com o qual tenho o prazer de trabalhar há anos no JM, acabou sendo notícia na revista FHOX (edição nº122, pág. 48). No texto (detalhe em vermelho) da noticia, o(a) redator(a) da famosa publicação (www.fhox.com.br) dirigida às atividades técnicas e comerciais da fotografia brasileira, deu uma demonstração inequívoca de que é um ser do asfalto como milhões de outros que vivem nas grandes cidades do país e têm dificuldades em distinguir um pato de uma galinha, chamando de POMBO assassino o “inofensivo” Quero-quero da foto (hehehe).

O Ed Dourado registrou o "ataque" passo a passo:

Cuidado, palmeirense...
esse quero-quero deve
ser corintiano...hehehe

Socorro!!

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

DE BEM COM AS AVES

Mas, não é sempre que o amigão Édio é alvo de ataques aéreos como o da foto, sofrido durante a cobertura de um treino do MAC no Abreusão. O moço até que se dá muito bem com as aves, como mostra nessas outras duas fotos que fez dias atrás em meio ao corre-corre diário entre uma matéria e outra. A tranquilidade com a qual a coruja e a maritaca das fotos acima e abaixo posam para sua lente é prova disso...rsrs
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domingo, 28 de setembro de 2008

O que há de mais triste com esses bustos de
praça pública não é que ninguém saiba quem
sejam: é que ninguém pergunta quem são.
(Mário Quintana)


Como seriam belas as estátuas eqüestres
se constassem apenas dos cavalos!
(Mário Quntana)

Eu queria escrever luxuoso. Usar palavras que rebrilhassem molhadas e fossem peregrinas. Às vezes solenes em púrpura, às vezes abismais esmeraldas, às vezes leves na mais fina seda macia. (Clarice Lispector)


Mesmo minhas alegrias, como são solitárias às vezes. E uma alegria solitária pode se tornar patética. É como ficar com um presente todo embrulhado com papel enfeitado de presente nas mãos - e não ter a quem dizer: tome, é seu, abra-o! Não querendo me ver em situações patéticas e, por uma espécie de contenção, evitando o tom de tragédia, então raramente embrulho com papel de presente os meus sentimentos. (Clarice Lispector)


Pois logo a mim, tão cheia de garras e sonhos, coubera arrancar de seu coração a flecha farpada. De chofre explicava-se para que eu nascera com mão dura, e para que eu nascera sem nojo da dor. Para que te servem essas unhas longas? Para te arranhar de morte e para arrancar os teus espinhos mortais, responde o lobo do homem. Para que te serve essa cruel boca de fome? Para te morder e para soprar a fim de que eu não te doa demais, meu amor, já que tenho que te doer, eu sou o lobo inevitável pois a vida me foi dada. Para que te servem essas mãos que ardem e prendem? Para ficarmos de mãos dadas, pois preciso tanto, tanto, tanto - uivaram os lobos e olharam intimidados as próprias garras antes de se aconchegarem um no outro para amar e dormir.

(Clarice Lispector - trecho do conto Os desastres de Sofia, do livro Felicidade Clandestina)


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sábado, 27 de setembro de 2008

ODE AO GATO

Os animais foram imperfeitos,
compridos de rabo, tristes de cabeça.
Pouco a pouco se foram compondo,
fazendo-se paisagem,
adquirindo pintas, graça, vôo.

O gato, só o gato apareceu
completo e orgulhoso:
nasceu completamente terminado,
anda sozinho e sabe o que quer.

O homem quer ser peixe e pássaro,
a serpente quisera ter asas,
o cachorro é um leão desorientado,
o engenheiro quer ser poeta,
a mosca estuda para andorinha,
o poeta trata de imitar a mosca,
mas o gato quer ser só gato
e todo gato é gato do bigode ao rabo,
do pressentimento à ratazana viva,
da noite até os seus olhos de ouro.

Não há unidade como ele,
não tem a lua nem a flor tal contextura:
é uma coisa só como o sol ou o topázio,
e a elástica linha em seu contorno firme e sutil
é como a linha da proa de uma nave.

Os seus olhos amarelos deixaram
uma só ranhura para jogar as moedas da noite .

Oh pequeno imperador sem orbe,
conquistador sem pátria,
mínimo tigre de salão,
nupcial sultão do céu das telhas eróticas,
o vento do amor na intempérie
reclamas quando passas
e pousas quatro pés delicados no solo,
cheirando, desconfiando de todo o terrestre,
porque tudo é imundo
para o imaculado pé do gato.

Oh fera independente da casa,
arrogante vestígio da noite,
preguiçoso, ginástico e alheio,
profundíssimo gato,
polícia secreta dos quartos,
insígnia de um desaparecido veludo,
certamente não há enigma na tua maneira,
talvez não sejas mistério,
todo o mundo sabe de ti
e pertences ao habitante menos misterioso.

Talvez todos acreditem,
todos se acreditem donos,
proprietários, tios de gato,
companheiros, colegas,
discípulos ou amigos do seu gato.

Eu não.
Eu não subscrevo.
Eu não conheço o gato.
Tudo sei, a vida e o seu arquipélago,
o mar e a cidade incalculável,
a botânica o gineceu com os seus extravios,
o pôr e o menos da matemática,
os funis vulcânicos do mundo,
a casca irreal do crocodilo,
a bondade ignorada do bombeiro,
o atavismo azul do sacerdote,
mas não posso decifrar um gato.

Minha razão resvalou na sua indiferença,
os seus olhos têm números de ouro.

(Pablo Neruda)


Na volta do Atacama, uma
escala em Isla Negra (rs)

As imagens desta postagem são da casa que, em 1939, o poeta Pablo Neruda comprou em Isla Negra, vila de pescadores próxima a Valparaíso, no Chile, onde viveu com a mulher Mathilde Urrutia até a sua morte, em 1973.


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Isla Negra, na verdade, não é uma ilha, mas o nome de uma pequena vila de pescadores no litoral chileno, às margens do oceano Pacífico, distante pouco mais de 100 quilômetros de Santiago, onde o poeta chegou em 1939, buscando refúgio para escrever seu engajado "Canto Geral". Havia apenas uma pequena casa no terreno de 5 mil metros quadrados, e Neruda foi construindo aos poucos a moradia definitiva, assessorado pelo arquiteto espanhol Germán Rodríguez Arias.

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Nos jardins, com uma privilegiada vista do oceano Pacífico, está a tumba do poeta. Em 1992, dois anos depois da redemocratização do Chile, seus despojos e os de sua última mulher, Matilde Urrutia, foram levados de Santiago até Isla Negra na cerimônia digna que a ditadura havia-lhe furtado 1973. No seu poema "Disposiciones", do "Canto Geral", Neruda externava sua vontade de ser enterrado em Isla Negra. Também tem um campanário e um barco -em que o poeta fazia seus "happy hours", mas sempre em terra, já que confessava ser apenas um "navegante de boca".

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Neruda viveu na casa de Isla Negra até poucos dias antes de morrer, em Santiago, vitimado por um câncer de próstata, em 23 de setembro de 1973, emblematicamente 12 dias depois da subida de Augusto Pinochet ao poder. Depois do golpe, as casas do poeta em Isla Negra e Santiago foram fechadas e saqueadas pelos militares. Diz a lenda que, diante da invasão de Isla Negra, Neruda teria dito aos soldados que sua única arma era a poesia. A Fundação Pablo Neruda obteve o controle do imóvel em 1986, o restaurou e abriu ao público em 1990, coincidentemente, mesmo ano do fim do regime de Pinochet.



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Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Escrever, por exemplo: "A noite está estrelada,
e tiritam, azuis, os astros lá ao longe".
O vento da noite gira no céu e canta.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Eu amei-a e por vezes ela também me amou.
Em noites como esta tive-a em meus braços.
Beijei-a tantas vezes sob o céu infinito.

Ela amou-me, por vezes eu também a amava.
Como não ter amado os seus grandes olhos fixos.
Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Pensar que não a tenho. Sentir que já a perdi.

Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ela.
E o verso cai na alma como no pasto o orvalho.
Importa lá que o meu amor não pudesse guardá-la.
A noite está estrelada e ela não está comigo.

Isso é tudo. Ao longe alguém canta. Ao longe.
A minha alma não se contenta com havê-la perdido.
Como para chegá-la a mim o meu olhar procura-a.
O meu coração procura-a, ela não está comigo.

A mesma noite que faz branquejar as mesmas árvores.
Nós dois, os de então, já não somos os mesmos.
Já não a amo, é verdade, mas tanto que a amei.
Esta voz buscava o vento para tocar-lhe o ouvido.

De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
A voz, o corpo claro. Os seus olhos infinitos.
Já não a amo, é verdade, mas talvez a ame ainda.
É tão curto o amor, tão longo o esquecimento.

Porque em noites como esta tive-a em meus braços,
a minha alma não se contenta por havê-la perdido.
Embora seja a última dor que ela me causa,
e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.

(Pablo Neruda)

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Grandes são os desertos
e as almas desertas e grandes.
Grandes são os desertos
e tudo é deserto,
Salvo erro, naturalmente.
Pobre da alma humana com
oásis só no deserto ao lado!

(Trecho do belo poema
GRANDES SÃO OS DESERTOS...
de Fernando Pessoa)
Lua no Deserto do Atacama (Foto de Sylvio Romero)


Pra matar a saudade de um amigo tuareg, embarquei numa curta mas deslumbrante viagem agora a pouco pelo site http://www.flickr.com/ e escolhi cinco belíssimas imagens do Deserto do Atacama, no Chile. (Sei que os tuaregs vivem no Deserto do Saara, mas esse meu amigo tem uma tenda de campo no Atacama...rs)


Deserto do Atacama - Vale da Morte (Foto de Marcela P. no flickr)

(clique sobre a foto para vê-la ampliada)

Deserto do Atacama - Vale da Lua (Galeria de +simples no flickr)

"Seguimos para Salar de Atacama, com mais de 320.000 m², observamos a crosta de cristais de sal. Abaixo destas placas há água, que no verão de evaporam e rompem estas crostas formando estas estruturas pontiagudas. As industrias que fazem a separação dos minerais e do sal, captam a pouca água que ali existe, causando um enorme impacto ambiental. Distante dos humanos, o Salar habita algumas espécies de ave, como os Flamengos Chilenos, Parina Chica, Parina Grande e alguns outros pássaros", conta Rogério Duarte em sua Galeria no flickr.

Deserto do Atacama - neve (Foto de Renato Valdes no flickr)


Concordo com o Aldous Huxley quando ele diz que "depois do silêncio, aquilo que mais aproximadamente exprime o inexprimível é a música." Hoje, acordei com Vieste, uma bela canção do Ivan Lins e Vitor Martins, na cabeça. Deve ser o efeito destas belas (e frias...brrrr!!) manhãs de setembro que andam me deixando assim, com a emoção à flor da pele. Coisas da primavera (hehehe).


Vieste

Vieste na hora exata
Com ares de festa e luas de prata
Vieste com encantos, vieste
Com beijos silvestres colhidos prá mim
Vieste com a natureza
Com as mãos camponesas plantadas em mim

Vieste com a cara e a coragem
Com malas, viagens, pra dentro de mim
Meu amor

Vieste a hora e a tempo
Soltando meus barcos e velas ao vento
Vieste me dando alento
Me olhando por dentro, velando por mim

Vieste de olhos fechados num dia marcado
Sagrado prá mim
Vieste com a cara e a coragem
Com malas, viagens, pra dentro de mim


(clique sobre as fotos para vê-las ampliadas)

sábado, 20 de setembro de 2008

Meses atrás, estimulado pelo amigo, também jornalista, Ramon a participar de um concurso intitulado “Nelson Rodrigues - Tragédias Cariocas Hoje”, escrevi o conto abaixo, inspirado na peça “Perdoa-me por me Traíres”, de Nelson Rodrigues.
Procurando ser literalmente fiel ao tema proposto pela organização do concurso, devo ter deixado a comissão julgadora indignada com minha ousadia em “ressuscitar” Glorinha (de Perdoa-me por me traíres), Hilda (uma das irmãs de Sete Gatinhos) e o próprio Nelson, na forma de espírito incorporado por uma de suas próprias personagens.
Após uma certa decepção ao ler os contos premiados com os primeiros lugares, todos acadêmicamente comportados e alheios à proposta de falar sobre as tragédias que se abatem atualmente sobre a cidade maravilhosa tendo como referência a obra deste grande (senão o maior) dramaturgo brasileiro, ficou a sensação de que valeu como exercício, como incentivo para novas incursões nesse gênero literário no qual jamais havia pensado antes em me aventurar.
Uma das coisas que aprendi com essa experiência foi não me preocupar com o que as pessoas podem dizer ou pensar a respeito deste e outros exercicíos literários que eu resolva praticar nessa área. Afinal, como dizia o escritor Mário de Andrade, “conto é tudo aquilo que o autor chama de conto”,

domingo, 14 de setembro de 2008

Olhai os lírios do campo!
Esta é uma das citações mais conhecidas da Bíblia. Faz parte de um dos mais belos momentos vividos pelos discípulos na companhia de Jesus. A essência de seu discurso envolvia a questão da ansiedade das pessoas, já naquele tempo, com a sobrevivência, com o vestir, o ter, o exibir. Na sua palavra, Jesus exortava os presentes no sentido de não se angustiarem tanto com as necessidades do dia a dia. Muito sabiamente, Jesus já preparava as pessoas daquele tempo - e dos tempos atuais - a respeito da importância de preservar sua qualidade de vida, não permitindo a ocupação da mente com pesos em excesso nem com uma configuração de vida super avaliada nas coisas materiais. Aliás, Jesus também deu uma certa importância às demandas materiais de nossas vidas, deixando bem claro, porém, de que nossa preocupação com essas coisas deveria caminhar até um certo limite. A partir daí...
“Olhai os lírios do campo!” Ao fazer tal afirmativa, Jesus queria ampliar nossos horizontes. Sabe-se que no campo existem armadilhas contra a vida. As aves de rapina, os répteis, os rigores do inverno, o calor inclemente do verão. Os predadores, os animais de grande porte, as ervas daninhas... Apesar disso tudo, os lírios também surgem, emoldurando com sua beleza uma nova realidade. O problema é quando o campo, em síntese, na ótica de Jesus, uma alegoria da vida, do mundo, é visualizado somente através das grossas lentes do negativismo gratuito. Apesar de todas as adversidades da vida, há sempre a presença de algo belo a ser visto, focalizado, priorizado. E que, diante de um vastíssimo leque de sentimentos que a vida nos impõe, tais como o egoísmo, o individualismo, a soberba, a arrogância, há sempre a chance de cultivarmos o belo, o frutífero, o substancial, o edificante.

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Ao que tudo indica, a planta que Jesus nomeou em seu discurso como lírio é hoje conhecida com o nome científico de “anemone coronária”. Tinha uma haste de uns 40 centímetros e pétalas vermelhas, púrpuras, azuis, róseas ou brancas. Como se vê, algo de uma beleza realmente estonteante em meio à aridez do solo palestino. Segundo relatos históricos era uma planta de floração comum na região, florescendo próxima ao tempo da colheita do feno. Devido à sua beleza, já era usada em larga escala na decoração dos ambientes requintados, bem como nas casas simples dos moradores do campo. Era, por assim dizer, um referencial de beleza, de nobreza, de excelência decorativa. Uma planta que realmente fazia a diferença. É nesse ponto que quero destacar o eixo sobre o qual gira o ensinamento de Jesus. Fazer a diferença. Priorizar sentimentos nobres sobre o negrume dos valores cultivados atualmente.
Há momentos na vida em que a mente se fecha. O horizonte divisado vai somente um pouco além das agruras do dia a dia. O belo da vida se perde diante da feiúra do contexto da existência. É preciso romper essa linha divisória que demarca a tristeza da alegria, a angústia da paz, o caos da ordem, da serenidade, da esperança. Quando o campo da existência está recheado de abutres, répteis e ervas daninhas, é necessário se crer que, mesmo num campo assim, a semente do lírio está lá, latente, pronta a brotar – a se fazer presente. A irradiar a vida com a variedade de suas cores, a emergir bela, firme, altaneira em meio à aridez da geografia social da atualidade. “Olhai os lírios do campo” é em sua essência uma receita inteligente de vida. Ou por outra, uma concepção ideal de vida para quem deseja enxergar a realidade atual como algo mais do que um mero passar de dias.

(Públio José, jornalista, publicitário)
O jardim de Giverny

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Um dos criadores do movimento artístico chamado Impressionismo, do final do século 19, Claude Monet comprou, em 1890, uma casa e terras em Giverny, uma vila às margens do rio Sena, 60 quilômetros a noroeste de Paris. Lá ele criou um grande jardim florido, bem próximo de sua casa e, no pedaço de terra restante, mandou construir um lago que ele encheu com milhares de lírios multicoloridos. Como ele mesmo dizia, era “para o prazer de seus olhos e para servir de tema para a pintura”.

Esses jardins tornaram-se seu tema principal pelo resto da vida. A pintura de Monet a partir do Século 20 faz lembrar o estilo japonês, com pontes arqueadas atravessando o lago, com o reflexo das árvores, misturando-se com os lírios pairando sobre a superfície da água.

Considerando a geografia local e a obra paisagística, a propriedade pode ser dividida em duas partes. A primeira chamada Le Clos Normand e a outra Le Jardin D´eau.
Le Clos Normand, primeiro pedaço de terra comprado por Monet possui 1 hectare, e um jardim feito de perspectivas, simetrias e cores. Nesse terreno, ele plantou flores perenes de tamanhos variados criando uma agradável sensação de volume, árvores frutíferas e ornamentais dominando o campo de visão. Várias flores foram misturadas neste terreno, em especial as margaridas e papoulas. O corredor central é coberto por arcos de ferro com rosas pendentes. Suas plantas foram escolhidas pela tonalidade de suas cores e deixadas crescer livremente pelo terreno, sem preocupação com as podas.

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Em 1893, dez anos após sua chegada em Giverny, Monet adquiriu o terreno ao lado do seu. Aí, passava um pequeno riacho chamado Ru , onde Monet criou uma pequena lagoa, que posteriormente tornou-se sua maior obra paisagística. O Jardim Aquático (Le Jardin D´eau), diferentemente do Clos Normand é cheio de curvas e elementos assimétricos, inspirado nos jardins japoneses que o pintor conhecia através de quadros da sua coleção.

Nesse jardim podemos encontrar a famosa ponte japonesa e as ninpheas, tão elegantemente retratadas em suas pinturas. Com esse pano de fundo, Monet pode se inspirar por mais de vinte anos, dedicando-se a retratar sua natureza repleta de cores, reflexos, transparências e formas.

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O Jardim de Giverny pode ser hoje admirado pessoalmente (fica a 70 km de Paris) e através dos seus inúmeros quadros expostos em espaços como o Musée D´Orsay e o Musée l´Orangerie, na capital francesa.

A primavera começa oficialmente às 12h44 do próximo dia 22. Mas já dá pra sentir no ar os sinais da chegada da nova estação. Além da mudança no regime de chuvas e temperaturas na maior parte do Brasil, os dias parecem mais alegres, iluminados por deslumbrantes de explosões de vida.
No final da tarde de ontem, em menos de 30 minutos sentado no quintal de casa, recebi a visita de um beija-flor, um bem-te-vi e três pequenos tico-ticos (que anos atrás apareciam aos montes e que atualmente parecem estar em plena extinção).
Na hora, bateu saudades da bela paineira-rosa que havia na porta da casa onde vivi os melhores anos da minha infância, em companhia de goiabeiras, mangueiras, abacateiros, laranjeiras e bananeiras que, generosamente, nos alimentavam com seus frutos e embelezavam o quintal com suas flores.

Paineira-rosa

Flor de goiabeira

Flor de laranjeira

Coreopsis, conhecidas como margaridinhas-amarelas. Estas lindas flores-do-campo (na foto com mosquitinhos brancos) nasciam às moitas em todo pasto ou terrenos abandonados de Marília em companhia de outras maravilhas da natureza como as das fotos abaixo, que deram um colorido especial aos caminhos da minha infância e hoje estão também praticamente extintas na região.

(clique sobre as fotos para vê-las ampliadas)


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Primavera

A primavera chegará, mesmo que ninguém mais saiba seu nome, nem acredite no calendário, nem possua jardim para recebê-la. A inclinação do sol vai marcando outras sombras; e os habitantes da mata, essas criaturas naturais que ainda circulam pelo ar e pelo chão, começam a preparar sua vida para a primavera que chega.
Finos clarins que não ouvimos devem soar por dentro da terra, nesse mundo confidencial das raízes, - e arautos sutis acordarão as cores e os perfumes e a alegria de nascer, no espírito das flores.
Há bosques de rododendros que eram verdes e já estão todos cor-de-rosa, como os palácios de Jeipur. Vozes novas de passarinhos começam a ensaiar as árias tradicionais de sua nação. Pequenas borboletas brancas e amarelas apressam-se pelos ares, - e certamente conversam: mas tão baixinho que não se entende.
Oh! Primaveras distantes, depois do branco e deserto inverno, quando as amendoeiras inauguram suas flores, alegremente, e todos os olhos procuram pelo céu o primeiro raio de sol.
Esta é uma primavera diferente, com as matas intactas, as árvores cobertas de folhas, - e só os poetas, entre os humanos, sabem que uma Deusa chega, coroada de flores, com vestidos bordados de flores, com os braços carregados de flores, e vem dançar neste mundo cálido, de incessante luz.
Mas é certo que a primavera chega. É certo que a vida não se esquece, e a terra maternalmente se enfeita para as festas da sua perpetuação.
Algum dia, talvez, nada mais vai ser assim. Algum dia, talvez, os homens terão a primavera que desejarem, no momento que quiserem, independentes deste ritmo, desta ordem, deste movimento do céu. E os pássaros serão outros, com outros cantos e outros hábitos, - e os ouvidos que por acaso os ouvirem não terão nada mais com tudo aquilo que, outrora se entendeu e amou.
Enquanto há primavera, esta primavera natural, prestemos atenção ao sussurro dos passarinhos novos, que dão beijinhos para o ar azul. Escutemos estas vozes que andam nas árvores, caminhemos por estas estradas que ainda conservam seus sentimentos antigos: lentamente estão sendo tecidos os manacás roxos e brancos; e a eufórbia se vai tornando pulquérrima, em cada coroa vermelha que desdobra. Os casulos brancos das gardênias ainda estão sendo enrolados em redor do perfume. E flores agrestes acordam com suas roupas de chita multicor.
Tudo isto para brilhar um instante, apenas, para ser lançado ao vento, por fidelidade à obscura semente, ao que vem, na rotação da eternidade. Saudemos a primavera, dona da vida - e efêmera.
(Cecília Meireles)

A terra é insultada e oferece suas flores

como resposta. (Rabindranath Tagore)